Crescimento Pós-Traumático x Estresse Pós-Traumático: Duas respostas possíveis à dor.
Georgia Tomazoni
8/23/20254 min read


Se você se sente constantemente frustrado, com a sensação de que sempre está devendo algo para alguém, essa história vai te dar uma nova perspectiva.
O início do fim de quem eu era aconteceu de forma muito abrupta: um burnout que se estendeu por quase cinco meses.
Eu era aquela pessoa em que talvez muitos se reconheçam: a que tenta abraçar o mundo inteiro, conduzida por um senso insano de perfeição.
Demorei a compreender que perseguir a perfeição não é virtude. Se ela fosse atingível, partindo da premissa de que ser perfeito é alcançar o cenário ideal em todos os aspectos da vida, nada mais teríamos para mudar. E que graça teria uma vida estagnada, sem a oportunidade de evoluir?
Eu verdadeiramente acreditava que poderia ser incrível em todas as minhas funções: mãe, esposa, dona de casa e empreendedora que gerenciava o marketing de 22 empresas em uma equipe de duas pessoas — eu e meu marido. Não conseguia terceirizar, porque meu ego, aparentemente, era maior do que a minha vontade de prosperar, e eu acreditava que ninguém cumpriria as demandas tão detalhadamente quanto eu.
Esse senso inatingível me acompanhava mesmo sendo mãe de uma menina autista, nível 3, que nunca dormiu mais do que três horas seguidas — o que significa que, há mais de seis anos, eu não sei o que é uma noite de sono inteira. E também de um menino de oito anos, cheio de energia e perguntas, que exige presença, curiosidade e disposição para acompanhar. Some a isso oito anos e meio de amamentação ininterrupta, um casamento com um homem de 34 anos no auge da sua testosterona — se é que você me entende — e mais todas as funções da casa para dividirmos entre nós dois.
Como caberiam em 24 horas todas essas demandas? E mais o desejo de ser escritora, atingir fluência no inglês, fazer natação e academia, cultivar amizades, estudar, criar conteúdo… tudo isso sob o ideal de ser impecável em cada uma dessas funções?
De fora, todos enxergavam que essa conta jamais fecharia. Mas eu seguia acreditando que conseguiria. Que eu era superpoderosa. E o que acontece com um cérebro submetido a esse tipo de pressão constante? Ele colapsa.
De um dia para o outro, eu perdi toda a minha estabilidade, perdi toda a minha motivação, perdi toda a minha vontade de viver, perdi toda a minha criatividade, perdi toda a minha paciência, perdi toda a minha fome. Entrei em mutismo, só conseguia pensar em resoluções muito trágicas para o meu futuro. E meu corpo se abateu tanto que tive uma infecção que subiu para os rins, urinei sangue, senti uma dor absurda e uma fraqueza que me fazia desacordar.
Meus clientes reduziram pela metade, o faturamento despencou, abandonei projetos que me orgulhavam. Perdi toda a minha lucidez e funcionalidade. Iniciei um processo de neuroavaliação, que me levou a um diagnóstico que eu suspeitava havia muito tempo. E a terapia me ofereceu o que eu nunca tinha permitido a mim mesma: uma pausa.
Aquilo não era vida, aquilo era um sufoco. Era uma pessoa presa, sem ver as grades que a trancavam, imersa num mundo irreal.
E, nesse longo período de recuperação física e mental, eu me redescobri. Tive tempo para pensar em tudo, ressignifiquei — com auxílio da minha psicóloga — muitas crenças que me mantinham presa nessa caixa de vidro. Ela dá o mérito para mim, mas faço questão de reafirmar a importância da Isabella nesse processo.
E, com essa oportunidade de me conhecer, voltei a fazer o que efetivamente me faz feliz: estudar, evoluir, crescer, mudar, melhorar o meu relacionamento comigo mesma, observar com carinho os meus erros e acertos, realinhar os trilhos e dar uma nova direção para a minha vida.
Não preciso estar todos os dias performando alegria. O que preciso é encontrar significado no ordinário. Redefini o que é ter sucesso. Para mim, hoje, não significa ser milionária aos trinta, morar em um duplex, viajar mensalmente, ter os looks mais lindos, os filhos rigorosamente seguindo uma rotina.
Esses desejos ainda existem, claro, mas não são a base da minha felicidade. Vou conquistá-los ao longo dos anos, com calma e respeitando o meu processo individual.
Hoje, a felicidade para mim está em ter as manhãs tranquilas para planejar meu trabalho, tomar um café conversando com meu marido, fazer minha leitura diária, escrever algumas páginas das minhas ideias, às vezes apenas dormir porque fiquei acordada com a minha filha das 2h da manhã até o amanhecer… Preparar um almoço gostoso para minha família, cuidar muito bem dos meus filhos. À tarde, cumprir minhas demandas de trabalho, ter tempo focado, pausas estratégicas. Finalizar o dia dormindo bem abraçadinha no meu marido. ISSO é felicidade!
Durante muito tempo, me senti vazia e incapaz justamente por não alcançar os objetivos irreais que eu mesma me impunha. Era como tentar misturar água e óleo. Agitar pode dar a ilusão de união, mas basta repousar para perceber a separação com o fenômeno da imiscibilidade, que é a reação química causada pela diferença de polaridade entre as moléculas de ambos. Assim era a minha vida: aparentava coerência no movimento, mas se desfazia ao menor silêncio.
Foi nesse ponto que compreendi o que a filosofia e a metafísica sempre tentam nos ensinar, mas ainda somos tolos demais para entender até viver a experiência na pele: a felicidade mora na nossa capacidade de CRESCER após um evento traumático, em vez de desenvolver algum transtorno, como comumente acontece. Recentemente descobri que esse fenômeno é chamado de crescimento pós-traumático, que é o oposto da síndrome do estresse pós-traumático, no qual pessoas afetadas por fases e acontecimentos difíceis usam disso para se superar e melhorar.
Enquanto o estresse pós-traumático paralisa, o crescimento pós-traumático nos transforma.
E é isso que eu desejo para mim e para você que me ouve: que cada cicatriz seja uma prova de sobrevivência e também um ponto de partida para uma vida mais consciente, mais humana e, finalmente, mais feliz.